GRITO...
Cedros, abetos,
pinheiros novos.
O que há no tecto
do céu deserto,
além do grito?
Tudo o que é nosso.
São os teu olhos
desmesurados,
lagos enormes,
mas concentrados
nos meus sentidos.
Tudo o que é nosso
é excessivo.
E a minha boca,
de tão rasgada,
corre o teu corpo
de pólo a pólo,
desfaz-te o colo
de espádua a espádua,
são os teus olhos,
depois do grito.
Cedros, abetos,
pinheiros novos.
É o regresso.
É o silêncio
de outro extremo
desta cidade
a tua casa.
É no teu quarto
de novo o grito.
E mais nocturna
do que nunca
a envergadura
das nossas asa.
Punhal de vento,
rosa de espuma:
morre o desejo
nasce a ternura.
Mas que silêncio
na tua casa...
DAVID MOURÃO-FERREIRA
« As virtudes perdem-se no interesse,
tal como os rios no mar! »
François La Rochefoucauld
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